Um vinho de altitude
Quando se pensa em vinho, se pensa em água, rios, vales... Lugares onde as uvas podem crescer e adquirir propriedades que diferenciam cada caldo por regiões, países ou variedades. As grandes áreas vinícolas do mundo levam em conta uma série de fatores, e não é raro que os lugares de implementação tenham séculos de história (Espanha, Itália, França). Na produção de vinhos estão envolvidas diversas questões técnicas, tais como a orografia, o clima e, claro, a altitude.
Assim ocorre desde os tempos dos egípcios, que iniciaram a produção vinícola às margens do rio Nilo. É justamente sobre a altitude que falaremos nesta coluna, na qual falaremos um pouco sobre o vinho do mundo que é produzido na parte mais alta do planeta – sob condições extremas, a mais de 3 mil metros. Frio e calor, oscilações impossíveis, paisagens essenciais, um vinho único de altitude.
A 18 quilômetros de Payogasta, na região de Cachi e a 140 km da cidade de Salta, estão os vinhedos de Colomé, uma vinícola fundada em 1831 pelo governador espanhol de Salta, Nicolás Severo de Isasmendi y Echalar. Em 1854 sua filha Ascensión, casada com José B. Dávalos, trouxe ao povoado de Colomé as uvas francesas cabernet sauvignon e malbec, antes da filoxera atacar as uvas ali. Três destes vinhedos ainda produzem uvas que são a matéria-prima dos vinhos Colomé. Em 2001, foram adquiridos pelo milionário suíço Donald Hess e sua esposa, Úrsula. Atualmente é a adega ativa mais antiga do país.
Nos vales Calchaquíes, as cores nas cordilheiras, que mudam de acordo com a posição do sol, compõem uma paisagem de cartão postal. A poucos metros um do outro estão os totens. De tanto em tanto, aparecem guanacos e também burros, que atravessam a estrada sem preocupação. Já os pumas, outros habitantes daquela região, preferem se esconder.
São mais de 25 mil hectares a perder de vista, com cerca de 30 hectares plantados com malbec, pinot noir, merlot, syrah, torrontés, sauvignon blanc e chardonnay. A 3.111 metros sobre o nível do mar, a cada ano nascem as uvas que darão origem aos vinhos mais altos do mundo, os chamados vinhos de altura máxima. As condições são extremas, mas as plantas estão em equilíbrio e oferecem um terroir único, diferente de todos os outros. No inverno, as temperaturas chegam a vários graus abaixo de zero. No verão, atingem os 40. A amplitude térmica diária oscila em 22/23 graus.
O proprietário queria fazer algo único, como plantar e elaborar vinhos a esta altura. Era todo um desafio e ele não imaginou que estaria vivo quando conseguisse atingir este objetivo. Mas conseguiu e, em março, surgiu a primeira colheita: um malbec 2012, um sauvignon blanc 2015 e um pinot noir 2014.
Cada um possui características próprias. O malbec, por exemplo, é uma mistura entre a concentração de altura, é frutado, equilibrado e elegante. A medida que o tempo passa, é possível entender mais e melhor sobre as plantas, sua evolução e sua adaptação ao terroir.
O sonho de Hess se tornou realidade. “Tornamos possível o impossível.”
Autor(a) : Rafael Paniagua
Publicado em: 16/10/2017
Última atualização: 27/11/2017
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